Documento da Semana — A quebra da ilusão civil: Ato Institucional n° 1 e a consolidação do poder militar pós-1964
Veja aqui o documento da semana em destaque! A quebra da ilusão civil: Ato Institucional n° 1 e a consolidação do poder militar pós-1964.
Confira o documento na íntegra no nosso acervo: Telegrama aéreo de John Keppel para o Departamento de Estado sobre aplicação do Ato Institucional

Artur da Costa e Silva, ministro da Guerra, e Augusto Hamann Rademacker Grunewald, ministro da Marinha, assinam o Ato Institucional nº 1, no Ministério da Guerra. / BR_RJANRIO_EH_0_FOT_PPU_06314
Para muitos civis que apoiaram o golpe de 1964, havia a perspectiva de que a interveção militar poderia ser cirúrgica, devolvendo o poder à classe política em pouco tempo. Dias após à queda de Goulart, porém, em 9 de abril de 1964, os militares decretariam o chamado Ato Institucional, que depois se transformaria em AI-1 quando novos atos foram impostos ao longo da ditadura. Com o AI-1 começaria a se desmanchar o mito de que, daquela vez, os militares viriam somente para tirar João Goulart do poder, voltando rapidamente para a caserna.
Um dos poderes autoritários conferidos pelo AI-1 ao general-presidente Castello Branco – e, antes dele, à Junta Militar liderada por Costa e Silva, que governou o país de facto nos dias iniciais pós-golpe – foi o de cassar mandatos de parlamentares e suspender direitos políticos de cidadãos brasileiros por 10 anos (esse poder tinha a vigência de dois meses, acabando em junho de 1964; depois ele seria renovado com os outros Atos Institucionais, como o AI-2 e o AI-5).
Perder direitos políticos significava, entre outras coisas, a proibição de votar e ser votado para qualquer cargo eletivo, o banimento de atividades político-partidárias, e o impedimento de participar de manifestações ou movimentos de cunho político. Algumas das principais lideranças do país à época, entre as quais João Goulart, Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e Leonel Brizola, tiveram seus direitos suspensos em razão do AI-1.
Apesar da arbitrariedade que a suspensão de direitos políticos significava, apontando para o caráter autoritário do regime que se instalava, os militares não tinham a obrigação de justificar o porquê de estarem suspendendo direitos de quem quer que fosse. E, de fato, os decretos de suspensão de direitos políticos normalmente vinham apenas com o nome dos atingidos, sem qualquer explicação.
No documento desta semana do NACE, temos uma fonte primária inédita e importantíssima. Trata-se de um relatório da Embaixada norte-americana no Rio de novembro de 1964 analisando as prováveis razões que culminaram com a suspensão de direitos políticos dos 378 brasileiros que sofreram essa arbitrariedade nos primeiros meses da ditadura. Pelo cômputo dos ianques, mais de 80% dos atingidos perderam seus direitos por serem considerados “comunistas”, e/ou por terem “colaborado materialmente com a ‘esquerda subversiva’”. Apenas uma minoria (8,7%) teria sofrido essa punição por suspeitas de corrupção.
O documento é riquíssimo ainda pelo fato de trazer nominalmente a lista dos 378 atingidos pelo artigo 10 do Ato Institucional, incluíndo, ao lado de cada nome, a razão provável de essas pessoas terem tido seus direitos políticos suspensos por dez anos.
Prof. Dr. Felipe Loureiro,
Vice-coordenador do NACE CNV-Brasil,
Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo