Documento da Semana — Eleições de 1965: A derrota nas urnas e o caminho para o AI-2
Veja aqui o documento da semana em destaque! Eleições de 1965: A derrota nas urnas e o caminho para o AI-2.
Confira o documento na íntegra no nosso acervo: Telegrama aéreo enviado pela embaixada do Rio de Janeiro para o Departamento de Estado sobre as eleições da Guanabara

Presidente Humberto de Alencar Castelo Branco (1964-1967) fora do Palácio da Alvorada: assina o Ato Institucional Número Dois (AI-2), Palácio do Planalto, Brasília, DF. / BR_RJANRIO_EH_0_FOT_PRP_08966
As eleições estaduais de outubro de 1965 constituíram um marco fundamental para o endurecimento do regime militar, apontando para uma intervenção muito mais longa e autoritária do que muitos da coalizão golpista imaginavam que seria o caso. Com a derrota que o governo Castello Branco sofreria nessas eleições, em especial nos estados de Minas Gerais e Guanabara (atual cidade do Rio de Janeiro), setores radicais do regime passaram a clamar pelo endurecimento da ditadura e pelo impedimento dos eleitos.
No final das contas, o general-presidente Castello Branco bancaria a posse dos escolhidos, mas não antes de decretar um novo Ato Institucional, o chamado AI-2, reformando drasticamente o Judiciário, dando fim às eleições presidenciais diretas, extinguindo todos os partidos políticos existentes – o que daria lugar ao bipartidarismo entre ARENA e MDB que marcaria a história da ditadura –, e reintroduzindo poderes do AI-1, entre os quais o de cassar e suspender direitos políticos por dez anos de qualquer cidadão brasileiro.
O que é menos conhecido nessa história, porém, foi o quanto o governo Castello, que decidira manter o direito de voto das pessoas para a escolha de governadores em 1965, teve uma postura autoritária com muitas das candidaturas que surgiram ao longo do ano, demonstrando os limites das eleições que ele próprio havia decidido permitir.
No estado da Guanabara, por exemplo, considerado um dos espaços políticos mais importantes pela ditadura, a primeira candidatura oposicionista, a do ex-ministro de Goulart, Hélio de Almeida, acabaria sendo impugnada após a aprovação de uma lei casuística visando exatamente tirar Hélio de Almeida do páreo. Depois, a oposição nomearia o ex-ministro da Guerra de Juscelino, o marechal Henrique Teixeira Lott, que também acabaria impugnado por uma tecnicidade. Até que, enfim, o nome que acabou prevalecendo, o de Negrão de Lima – também ex-ministro de Juscelino, mas com trânsito junto ao próprio general-presidente Castello Branco – acabaria se sagrando vitorioso contra Flexa Ribeiro, o candidato apoiado pelo governador em curso e candidato à presidência, Carlos Lacerda.
No documento do NACE desta semana, temos um relatório riquíssimo da Embaixada norte-americana no Rio de Janeiro de setembro de 1965 analisando, em detalhes, como se deu a articulação – e, depois, a obstrução – das candidaturas Hélio de Almeida e Teixeira Lott na Guanabara, culminando no nome de Negrão de Lima. Mais do que isso, o relatório mostra o quanto, no início, a candidatura Negrão de Lima era vista com bons olhos pelo núcleo duro do governo Castello, que interpretrava, corretamente, as eleições na Guanabara como um meio de colocar areia nos sonhos presidenciais de Carlos Lacerda.
Seria apenas com a campanha agressiva de Lacerda contra Negrão de Lima, acusando-o de receber apoio dos comunistas, que o governo Castello seria obrigado a recuar, apoiando, mesmo que formalmente, a candidatura pró-Lacerda na Guanabara. Mas de pouco adiantaria. No final das contas, a derrota na Guanabara e em Minas seria explorada por políticos como Lacerda e outros para acusar o governo Castello de ser contra-revolucionário, o que daria origem à grave crise política que desembocaria na decretação do AI-2.
Prof. Dr. Felipe Loureiro,
Vice-coordenador do NACE CNV-Brasil,
Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo