Documento da semana! Os conflitos intramilitares e o endurecimento do regime: Castello Branco na berlinda
Confira o documento na íntegra no nosso acervo: Telegrama aéreo de Niles W. Bond para o Departamento de Estado relatando uma conversa com Robert J. Alexander
Os conflitos intramilitares e o endurecimento do regime: Castello Branco na berlinda
O contexto era de grande tensão. O governo Castello Branco havia acabado de baixar o Ato Institucional número 2, extinguindo todos os partidos políticos, reinstituindo o poder arbitrário do presidente para cassar mandatos parlamentares e suspender direitos políticos de cidadãos, jogando para a alçada da Justiça Militar os crimes contra a segurança nacional, e tornando indireta a eleição do futuro presidente da República.
Mas, para alguns setores militares autointitulados “linha dura”, isso ainda não era suficiente. Achavam que Castello estava sendo leniente demais com agentes “subversivos”, inclusive com “comunistas”. Queriam, antes de tudo, que as eleições para governadores estaduais que haviam ocorrido no início de outubro de 1965 nem tivessem acontecido; já que aconteceram, buscavam, ao menos, que os candidatos da oposição que tinham levado estados considerados cruciais, como Minas Gerais e Guanabara (atual cidade do Rio de Janeiro) – vencidos por Israel Pinheiro e Negrão de Lima, respectivamente, ambos do Partido Social Democrático (PSD) –, no mínimo fossem impedidos de assumir seus postos.
Castello havia baixado o AI-2, pressionado pela crise que as eleições de outubro de 1965 tinham gerado, mas o marechal presidente queria garantir, ao menos, a posse dos governadores eleitos. O impasse com a linha dura estava montado.
No documento da semana de hoje, temos uma excelente oportunidade para vislumbrar a delicadeza política daquele momento. Um dos coronéis líderes da autointitulada “linha dura”, Osnelli Martinelli, confidencia a um professor universitário norte-americano, Robert Alexander, que estaria sendo montado um esquema para derrubar Castello – sim, derrubar Castello! – antes da posse programada de Negrão de Lima, que ocorreria na Guanabara em 5 de dezembro de 1965. Segundo Martinelli, se Castello conseguisse passar pelo teste de 5 de dezembro, ele conseguiria se manter na presidência até o final de seu mandato, em março de 1967.
Apesar da tensão que rondou o período próximo à nomeação do governador da Guanabara, a posse acabaria acontecendo sem sobressaltos. Castello havia pagado para ver e conseguira resistir à pressão de elementos da dita “linha dura” para barrar a ascensão de eleitos da oposição ao poder. Mesmo com essa resistência de Castello, o fato é que, com o AI-2, o país havia dado um passo significativo para a consolidação de uma ditadura militar de longo prazo.
O documento da semana nos mostra, de qualquer forma, a complexidade da política militar durante o primeiro governo ditatorial, e o quanto, para alguns, a ditadura não vinha sendo ainda suficientemente ditatorial.
Prof. Dr. Felipe Loureiro,
Vice-coordenador do NACE CNV-Brasil,
Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo