Documento da semana! A presença dos americanos nas disputas de poder pela sucessão de Castello Branco
Confira o documento na íntegra no nosso acervo: Memorando de conversação redigido por Frank C. Carlucci sobre a candidatura de Arthur da Costa e Silva

A presença dos americanos nas disputas de poder pela sucessão de Castello Branco
Os norte-americanos tiveram uma excelente penetração entre membros das elites militares e políticas brasileiras no período de transição entre os governos Castello Branco e Costa e Silva. Um dos aspectos mais interessantes que decorre dessa penetração foi a constatação, da parte de vários interlocutores dos ianques, de que Castello Branco não iria permitir que Costa e Silva assumisse a presidência no início de 1967.
O documento desta semana trata desse aspecto de forma bastante interessante. Trata-se de um “memorando para o arquivo” – ou seja, um memorando escrito por um funcionário da Embaixada norte-americana no Rio endereçado aos arquivos da Embaixada – que relata conversas com dois políticos locais do antigo estado da Guanabara (Luiz Gonzaga da Gama Filho e Paulo Ribeiro), com o ex-presidente do PTB (Lutero Vargas) e com um intelectual (Cândido Mendes de Almeida) que possuía fortes conexões com o então chefe do Serviço Nacional de Informações, gen. Golbery do Couto e Silva, sobre a disputa Castello-Costa e Silva às vésperas de Costa e Silva entregar o ministério da Guerra para assumir plenamente a candidatura presidencial.
Todos os interlocutores dos ianques defenderam a tese de que, uma vez deixando o ministério da Guerra, Costa e Silva ficaria suscetível a uma manobra de Castello Branco para retirá-lo da posição de candidato favorito à presidência da República. A lógica por detrás desse argumento era a de que Castello, que já vinha preenchendo postos estratégicos do Exército com aliados próximos, em particular os 2º e 3º Exércitos em São Paulo e Rio Grande do Sul, respectivamente, iria dar a cartada final colocando alguém da sua mais profunda confiança no ministério da Guerra – o que, de fato, ele faria, com a nomeação do general Ademar de Queiroz – a fim de bloquear a candidatura de Costa e Silva.
O que chama a atenção é a certeza dos interlocutores norte-americanos de que o desenvolvimento acima iria acontecer, e a coincidência de visões nesse sentido. Por outro lado, o fato de os políticos locais da Guanabara pertencerem ao MDB deixa os norte-americanos um pouco com a pulga atrás da orelha, já que, como o próprio funcionário da Embaixada ianque afirma no documento, a única chance que o MDB tinha de emplacar alguém na presidência seria dividindo as forças de Castello e Costa e Silva, o que provavelmente abriria espaço para uma terceira via ganhar força no processo eleitoral indireto – no caso, supostamente alguém com apoio do MDB.
No final das contas, apesar da certeza dos interlocutores ianques, Castello colocaria, sim, alguém de sua estrita confiança no ministério da Guerra em substituição à Costa e Silva, mas não faria qualquer movimento para impedir que seu ex-ministro se tornasse presidente. Costa e Silva acabaria se tornando o segundo general presidente da ditadura brasileira.
Prof. Dr. Felipe Loureiro,
Vice-coordenador do NACE CNV-Brasil,
Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo