Documento da semana! Uma “nota de advertência” numa “conjuntura crítica”

Veja aqui o documento da semana em destaque! Uma “nota de advertência” numa “conjuntura crítica”
Confira o documento na íntegra no nosso acervo: Telegrama de John Wills Tuthill ao Secretário de Estado em Washington D.C. sobre a sucessão presidencial de Castello Branco para Costa e Silva
Discurso do marechal Castello Branco (esquerda) na posse do presidente general Costa e Silva (direita). Fonte: BR RJANRIO PH 0 FOT 42329 026

Uma “nota de advertência” numa “conjuntura crítica”

Após a tomada de poder pelos militares em abril de 1964, Castello Branco assumiu a presidência da República e Costa e Silva o posto de ministro da Guerra. Crescentemente insatisfeito com os rumos da administração (especialmente pela austeridade econômica e falta de protagonismo de um grupo de militares que clamavam por medidas ainda mais autoritárias, a “linha dura”), Costa deixou o cargo em 1966 e passou a fazer campanha para se tornar presidente. Eleito indiretamente por um Congresso deformado, ele viajaria a Washington para um encontro com o presidente Johnson em janeiro de 1967. 

No documento desta semana do NACE CNV-Brasil, datado de 2 de março de 1967, o embaixador dos Estados Unidos no Brasil, John Tuthill, envia um detalhado telegrama ao Departamento de Estado em Washington afirmando ter inúmeras indicações que a nova administração Costa e Silva (ele seria empossado no dia 15) seria “radicalmente diferente” no estilo e talvez em certos assuntos substantivos se comparada ao governo Castello Branco. 

Após Washington ter “três anos de colaboração próxima e mesmo identificação com o governo Castello Branco”, o embaixador sublinhava que havia uma “ebulição política geral” no país – observada não somente na ARENA (partido governista) e no MDB (oposição) –, mas em diversos agrupamentos políticos não representados no governo e na “porção politicamente ativa dos militares”. A “característica marcante” do novo gabinete de ministros, segundo Tuthill, seria “o número de críticos abertos ao regime atual”, especialmente da “linha dura”. Mesmo admitindo que esse não era um grupo “estável” e “politicamente coeso”, Tuthill ponderava que ele poderia “gerar quase uma pressão irresistível em certos tópicos”. 

Por fim, apesar de admitir que o telegrama soava como uma “nota de advertência”, o embaixador afirmava que não via alternativa ao oferecimento de apoio ao novo governo. Sem esse apoio, prosseguia Tuthill, ele teria “pouca chance de sucesso”. Considerava uma “conjuntura crítica” e que “reticência ou hesitação” por parte de Washington somente aumentaria o “risco de extremismo”, vindos da esquerda ou da direita, no futuro. 

As preocupações de Tuthill não se mostrariam infundadas. Mobilizações da sociedade civil e ações da esquerda armada colocaram pressão sobre o governo que respondeu brutalmente decretando o AI-5 em dezembro de 1968. O documento ilustra bem a preocupação do representante norte-americano sobre a possibilidade de fechamento da ditadura brasileira já em março de 1967. Esse tipo de advertência se tornaria mais frequente ao longo do biênio 1967-68.

Dr. Gianfranco Caterina,

Pesquisador do NACE CNV-Brasil,

Pós-doutorando no Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo

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